quinta-feira, fevereiro 15, 2007

O estranho pregador

João Batista era um estranho pregador. Não procurou um templo aconchegado, uma casa confortável, um cinema decadente e muito menos um templo forrado a ouro para pregar a Palavra de Deus. O seu púlpito era o inabitado e inóspito deserto. Para além de se vestir mal – com pêlos de camelo e um cinto de couro – alimentava-se com uma intragável dieta: gafanhotos temperados com mel. Ao seu lado não tinha um consagrado e sonante grupo de louvor, nem assistentes gordos besuntados pela “unção”, os únicos seres que provavelmente cantariam à sua volta (e que também saltavam, como hoje) eram gafanhotos; mas ele comia-os. Tinha ainda o descaramento de não pedir dízimos nem solicitar colectas para o mantimento da sua pregação. Não consta que falasse com muitos anjos ou que tenha feito grandes prodígios, milagres, curas ou maravilhas. A sua mensagem era rude, impopular e politicamente incorrecta: “Raça de víboras, quem vos ensinou a fugir da ira vindoura?” – será que ele não conhecia as regras mais elementares de Homilética? Insistia para que as pessoas se arrependessem e falava muito de um reino invisível que estava para chegar. Para confirmar os frutos do arrependimento, mergulhava os pecados e as pessoas no rio Jordão. Embora ele pregasse as águas, ao contrário de muitos de hoje, acreditava também no fogo. O fogo do alto.

Um dia Jesus veio ter com Ele e pediu também para ser baptizado. Jesus falando dele disse: “Em verdade vos digo que, entre os que de mulher têm nascido, não apareceu alguém maior do que João Batista”. João porém, não se achou digno de baptizar Jesus. Sabia quem ali estava. Jesus como que insistindo com ele, aquiesceu.

No final, e porque expunha o comportamento pecaminoso dos mais importantes políticos, cortaram-lhe a cabeça. Expuseram triunfantemente num prato a cabeça ensanguentada do pregador do deserto. Tiraram-lhe a vida, mas a sua pregação ainda ecoa hoje pelos desertos e nas águas, suplicando para que se levantem homens arrojados que gritem as suas palavras: “É necessário que ele cresça e que eu diminua.”
Mas quem está disponível para ficar sem a sua cabeça?

2 comentários:

Unknown disse...

Simplesmente Excepcional!!!
Meus parabéns pelo texto...
Gostaria de estar o usando...acaso não se importe....

Jorge Oliveira disse...

Obrigado Pensador.
Podes usar desde que refiras a fonte.
Abraços.