segunda-feira, abril 28, 2008

Arregalando os olhos

E já agora, para os que andam cansados dos domingos, cá vai mais uma sugestão de leitura de uma meditação de Ricardo Gondim.

«Terminado o culto do domingo, aceitei o convite para um belo almoço com amigos de longa data. Conversamos sobre tudo. Lá pelas tantas, falamos sobre os conteúdos de meus sermões. Fui incentivado a manter o curso; mas eles foram cândidos (não é para isso que servem os amigos?): “Ricardo tem muita gente achando que você endoidou”. “Os seus textos e sermões são discutidos em rodas de bate-papo e o pessoal não economiza pedradas”.

Quase me entalei. Porém, lembrei-me da fúria que neo-fundamentalistas-puritanos mostraram quando abriram fogo contra mim; nada mais me assusta. Sei que os ultra-calvinistas, os donos da melhor teologia, os autênticos interpretes das Escrituras, me tratam como a bola que precisa ser encaçapada; sei que os teólogos da melhor cepa, os professores de seminário, me ridicularizam em classe; sei que os xerifes da reta doutrina já fizeram até programa de rádio para me desmerecerem. Já não me aterrorizo com suas investiduras.

Alguns me tratam como um mal resolvido, amargurado com Deus e com o mundo. Outros me julgam um feixe de contradições, amarrado com os barbantes do comunismo. São tantas fofocas, que recebi um e-mail questionando se eu havia aderido ao “ateísmo aberto” – precisei responder que, obviamente, ainda não me considero um ateu.

Há algum tempo, eu pregava na Comunidade de um amigo nos Estados Unidos e recebi um convite para falar noutra igreja. Horas antes do compromisso, o pastor encarregado por aquele culto me telefonou cobrando “explicações”, porque fora informado de “gravíssimas acusações” contra mim. Ele estava com medo de me receber em sua comunidade; contou, inclusive, que um grupo prometera repetir o piquete na porta da igreja como fizeram no Ceará.

O rescaldo de todo esse infame patrulhamento me dá vontade de rir; mas também me empurra para longe do “mundinho gospel” com sua lógica tosca, com sua intolerância soberba e com seu messianismo ufanista. Ainda hoje, um pastor amigo me disse que usou uma citação minha em um sermão e notou que o auditório arregalou os olhos. Quando terminou, perguntaram-lhe se não sabia que eu não devo ser mencionado - sou tão mal visto que estrago a argumentação.

Reajo a tudo isso, dizendo que não devo satisfações senão à minha consciência, às Escrituras e à minha comunidade, onde ministro todos os fins-de-semana. Cheguei à idade que já não espero o olhar de aprovação dos zelosos reverendos denominacionais – aliás, nunca cobicei, por isso, quando recebi o batismo no Espírito Santo fui expulso da igreja Presbiteriana.

Hoje pela manhã batizamos mais de cinqüenta pessoas, a maioria jovem. Empolguei-me com o brilho diferente em seus olhos. Algo me dizia que essa turma quer servir a Deus sem os ranços de uma religião que cheira a mofo. Notei que os pais também celebravam, ao meu lado, a profissão de fé que seus filhos faziam.

Tem hora que dá vontade de afastar-me de tudo – penso em seguir o exemplo de diversos líderes que não suportaram o jugo dos doutores da lei e tomaram outras estradas. Já pensei em decretar o meu próprio exílio, minha saída radical desse ambiente pequeno que só me fatiga, mas contemplo essa próxima geração e cobro de mim mesmo: “Continue, por Jesus e por eles!”.

É isso...

Soli Deo Gloria.»


Continue Ricardo!
Também por mim.

1 comentário:

Anónimo disse...

Jorge. Tenho o privilégio de frequentar a comunidade onde o Gondim é pastor.
Há algo que incomoda muito os tradicionalista na figura do Gondim: ele é Gondim o tempo todo. Sincero e assustadoramente verdadeiro. Ele incomoda só de ser.
Abraço