quinta-feira, agosto 02, 2012

"Simplesmente viver"



Jorge Luis Borges conta a história de Johannes Dahlmann ("Ficções", Editora Teorema), que é acometido por uma septicemia mortal, que lhe causa febres delirantes e fica à beira da morte. Durante esse tempo, é atormentado pelas gravuras de Mil e Uma Noites, de Gustav Weil. Todavia, quis Deus que Dahlmann melhorasse e os médicos aconselham-no a descansar num sítio calmo. Vai convalescer para uma quinta do Sul. Durante a viagem de comboio, Dahlmann tenta ler as Mil e Uma Noites, o livro que quase lhe roubou toda a felicidade - "a realidade gosta das simetrias e dos leves anacronismos" -, mas cansado, fecha-o e deixa-se "simplesmente viver". Uma paragem forçada obriga Dahlmann a sair e a procurar repouso numa velha venda. Jornaleiros bêbados atiram-lhe com umas bolinhas de miolo de pão. Riem. Troçam do sinistro viajante. A zombaria grosseira é sempre o argumento dos desatilados. Dahlmann tenta abrir novamente o volume das Mil e Uma Noites. Mais bolinhas de pão. Fecha o livro e resolve ir embora. Mais humilhação. Um iminente duelo mortal de navalhas encerra o conto. O que outrora foi moribundo e procurava descanso sai empunhando com firmeza a navalha na mão. Johannes Dahlmann decidiu lutar. Viver!

1 comentário:

O Tempo Passa disse...

Pronto! Agora vou ter que ler esse Borges que ainda não li... mais um na lista, que já tá longa!!!