segunda-feira, julho 16, 2012

A vida pecaminosa do eu

Brennan Manning no seu livro "O obstinado amor de Deus" (Mundo Cristão), socorre-se de Thomas Merton e do grande Agostinho para clarificar o que verdadeiramente está envolvido na problemática do pecado.


«O conceito de pecado de Thomas Merton não se centra em actos pecaminosos isolados, mas fundamentalmente no acto de optarmos por uma vida de fingimento. A vida em torno do falso eu gera o desejo compulsivo de apresentar ao público uma imagem perfeita, de modo que todos nos admirem e ninguém nos conheça. “Só pode haver dois amores fundamentais”, escreveu Agostinho, “o amor a Deus, numa negligência do meu eu, ou o amor do eu, numa negligência de Deus.”

Merton disse que a vida dedicada à sombra é uma vida de pecado. Pequei em minha recusa covarde — por temer ser rejeitado — de pensar, de sentir, de agir, de responder e de viver a partir do meu eu autêntico. Recusamos ser nosso verdadeiro eu até mesmo com Deus — e depois nos perguntamos por que nos falta intimidade com ele.

O ódio pelo impostor é na verdade o ódio de si mesmo. O impostor e eu constituímos uma só pessoa. O desprezo pelo falso eu dá vazão à hostilidade, o que se manifesta como irritabilidade geral — irritação pelas mesmas faltas nos outros que odiamos em nós mesmos. O ódio próprio sempre redunda em alguma forma de comportamento auto-destrutivo.

Aceitar a realidade da nossa pecaminosidade significa aceitar o nosso eu autêntico. Judas não conseguiu encarar sua sombra; Pedro conseguiu. Este fez as pazes com o impostor interior; aquele se levantou contra ele. Quando aceitamos a verdade do que realmente somos e a rendemos a Jesus Cristo, somos envoltos em paz, quer nos sintamos em paz, quer não. Quero dizer com isso que a paz que ultrapassa o entendimento não é uma sensação subjectiva de paz; se estamos em Cristo, estamos em paz, mesmo quando não sentimos nenhuma paz.»



O escritor do Salmo cinquenta e um, atribuído ao Rei David, homem que era "segundo o coração de Deus" mas que conhecia muito bem a realidade que Manning descreve, grita desesperado: "Eu conheço as minhas transgressões, e o meu pecado está sempre diante de mim."

O Apóstolo Paulo também conhecia bem esta verdade quando declara "eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem algum; e, com efeito, o querer está em mim, mas não consigo realizar o bem. Porque não faço o bem que quero, mas o mal que não quero, esse faço. Ora, se eu faço o que não quero, já o não faço eu, mas o pecado que habita em mim. Acho, então, esta lei em mim: que, quando quero fazer o bem, o mal está comigo."

Os versículos iniciais do Salmo 51, são a chave para toda esta intrincada problemática do pecado: "Tem misericórdia de mim, ó Deus, segundo a tua benignidade; apaga as minhas transgressões, segundo a multidão das tuas misericórdias. Lava-me completamente da minha iniquidade e purifica-me do meu pecado." Quando conhecemos e reconhecemos quem somos, e clamamos pela misericórdia e bondade de Deus, Ele perdoa-nos e purifica-nos. Só mesmo Deus sabe lidar com o nosso pecado. Ele pode.

Sem comentários: